O teatro tem relação umbilical com a oratória.
Na Grecia Antiga, o logógrafo era aquele profissional que escrevia discursos. No meio forense, foi o embrião da advocacia (não custa lembrar que a origem da arte retórica remonta a disputas possessórias em tribunais, com o sofista Corax, no seculo VI a.C.). Em Atenas - voltando ao logógrafo -, a parte “da relação de direito material” é que devia discursar; só era possível, então, delegar ao logógrafo uma parcela do discurso: o que falar (inventione), em que ordem (dispositio) e com qual elocução (elocutio). A proclamação (actio), por sua vez, ficava por conta da parte. Terceirizava-se o roteiro da peça; não, porém, a atuação.
O maior exemplo histórico é a própria Apologia de Socrates (399 a.C.), o famosíssimo discurso de defesa diante da acusação de cultuar outros Deuses e de corromper a juventude: Lisias, sofista, sugeriu um discurso (rechaçado por Socrates). No entanto, aceitando ou não, cabia a ele, Socrates, sustentar oralmente, tal como ocorreu.
Nesse contexto, a parte, nos limites da capacidade performática e, portanto, nos limites do que soaria natural, discursava. Mas, para além da naturalidade, outra preocupação era com a adequação do personagem (kairos), ou seja, com um orador que demonstrasse indignação em discurso irado; comiseração em discurso piedoso; serenidade em discurso técnico. Na prova oral, um personagem é esperado pela banca: alguém natural, assertivo e que transmita equilíbrio emocional. Mais racional; menos passional. Mais sereno; menos colérico. Um juiz. Um promotor. Não um político. Nem um professor. Tampouco um locutor esportivo. Incorporando aos poucos esse personagem desejado, o orador passa a agir, com naturalidade, como se fosse ele: coimplicam-se a naturalidade e a adequação.
Assim, ao candidato da prova oral (mesmo sem ter feito aula de teatro), eis uma boa metáfora pedagógica: viva tão intensamente o personagem adequado a ponto de os sentimentos dele serem os seus!
0 Comments: